quinta-feira, 22 de março de 2012

Falta educação na composição da clientela da CPTM

Sete da manhã. Trem lotado; calor; gente doente, com sono e mal-paga. Todos num mesmo vai e vem, numa mesma força de vontade. Alguns falam demais, outros, de menos e há, também, os que muito fazem e aqueles que não fazem nada.
Num vagão de trem, arrisco eu, deve caber cerca de 70, 80 pessoas sentadas. Não confortavelmente, mas acomodados - o que não é difícil, considerando-se o cansaço dos sortudos que estão ali, só se encostando, sem nunca terem se visto na vida. Em pé, neste horário, é possível acrescentar a esse número dos sentados, no mínimo, mais o dobro deles. É necessário toda uma gama de tentativas (mal-sucedidas e) diárias até que se consiga manter-se em pé, não preso entre uma axila e uma virilha masculina e se segurar (se com sorte, com a mão toda) numa das barras de apoio da composição.
Numa dessas experiências de 'encontrar a posição ideal para manter-se em pé durante uma hora sem dor e sem aperto', arrisquei parar em frente a um banco, de frente para a janela e de costas para uma das portas. Amigos... bad, bad idea. Nas estações com pico de novos passageiros, todos se movem pra dentro do trem numa mesma massa e azar de quem estiver na frente. Imagine você quem é a última pessoa possível à frente. Sim, quem está nessa posição que eu descrevi. Agora pense que, hoje, nesse lugar, nessa hora, estava uma grávida.
Segundo a Lei Estadual número 12.225 de 2006, "os assentos com indicação são de uso preferencial. Respeite esse direito". Respeitar... antes de fazê-lo, deveríamos, ao menos, conseguir ouvir o maquinista que repete isso umas centenas de vezes diariamente. Entretanto, o balanço da minhoca de sucata não faz audível a voz daquele que mal sabe o que acontece no interior das várias portinhas da minhoca; de dentro de seus poros - e onde, de tão entupidos, quase não dá pra respirar.
Assim como minhas paixões, resolvi dar um nome para a grávida e ver se dá pra entender melhor. Portanto, lá estava Maristela, 26 anos, grávida de seis meses do namorado/marido desleixado que ainda não comprou uma aliança - ou de algum affair da última domingueira de forró que participou em Franco da Rocha. Nessa cidade ela entrou e ficou do mesmíssimo jeito até a estação Piqueri. Seis estações e quarenta minutos depois. Por que ficou em pé? Porque todos sortudos sentados dormiam - não os culpo. Em partes. Por que, finalmente, se sentou? Porque dona Maria Aparecida, encarregada da limpeza na Rede Record de Televisão, 50 anos, três filhos, resolveu se levantar.
Fiquei olhando tudo aquilo com muita vontade de falar alguma coisa, mas estava muito atônita e cansada e acho que seria só falação, porque não iria mudar o tanto que ela já tinha ficado em pé. Não foi uma boa desculpa. Assim como o fato de os sortudos estarem dormindo por estarem cansados e, por isso, não cederem o lugar à Maristela também o é. O mínimo que uma pessoa que se permite infringir uma Lei Estadual (relatada da maneira mais facilmente compreensível, com linguagem coloquial, desenhos e texto curto logo acima da cabeça de todos) e sentar no assento preferencial pode fazer é ficar atenta ao que está acontecendo no vagão. Em todas as paradas, acordar, olhar à volta e ver se não tem ninguém mais velho, gestante, deficiente, obeso ou com criança de colo que queira se sentar. Se tiver, levantar sem bufar com bafo na cara de ninguém, delicadamente e fim; feito seu papel de pessoa educada. Difícil? Não mais do que lutar contra esse mal crônico que é a preferência pelo ignorar e pela ignorância.