terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

Olheira da Composição: Episódio I

(Lá vou eu pra mais uma tentativa de abertura de sessão dentro do blog...)

Todo dia, às 7h45, eu to na plataforma da Linha 1 Azul do metrô, na Estação da Luz. Amigo, você sabe o que é isso? Pois é, nem eu sabia. O que tem de gente apressada, sonolenta, com bafo e burra ali não tá escrito. Mas, também, como que num bônus de Deus pras maselas que acompanham o 'acordar às 4h45', também dá pra se apaixonar diariamente naqueles dois minutos que fico esperando a próxima composição.
Não é difícil, convenhamos. Estamos falando de São Paulo; estamos falando de dois milhões de pessoa por dia no metrô. Tem gente pra tudo quanto é gosto MESMO. E, confesso: pro meu é bem difícil de achar - pelo menos, nessa linha, nesses dia e horário. Entretanto, todo dia eu procuro um alguém pra quem eu olhe, me atraia (pelo menos, com a atenção) e, partir disso, eu consiga traçar um perfil dele.

Para começar bem - e com atraso -, vou falar sobre dois belíssimos que cruzaram meu caminho ontem. O primeiro, denominado por mim, "Robson", apareceu na fila das catracas da conexão CPTM/Metrô.
Robson estava a caminho de seu trabalho em Perdizes, naquela agência de Publicidade onde ele trabalha na Criação. Ou, então, naquela editora de revista em quadrinhos, onde é o colorista. Ele tem 22 anos, um metro e 80, calça 40 e tem um grau de hipermetropia no olho direito por trás daqueles óculos bonitos de hipster. Sua cabeça é raspada com a máquina dois, suas orelhas - se bem me recordo - são uns 12mm alargadas, cada uma.
Meu muso número um usa camisa cinza axadrezada em lilás, calça Vans preta e um tênis desses grandinhos de andar de skate - o que ele provavelmente faça aos domingos no Ibirapuera ou Villa-Lobos. O coração do menino está tomado por uma paixão que surgiu no final de semana - Estela; cabelos compridos e castanhos, magra e branquinha. Os pais dele são separados há cinco anos; hoje, mora com a mãe e o irmão mais novo, Felipe, de 12 anos. Robson é do tipo gentil, que paga cafés ou chicletes a amigos e compra um presentinho fofo para a mãe no Dia da Mulher. Ele está no terceiro ano da graduação no Mackenzie. E tudo isso eu sei por um minuto e meio de contato visual com sua nuca.

Alexandre não. Alexandre é o oposto de Robson - e digo isso em todos os sentidos, pois, se o muso dois não for gay, não digo nada...
Já dentro do metrô, Alexandre atrapalha a passagem com suas magreza e altura de múmia. Ele é requintado, do tipo que bebe vinho tinto, sentado em seu sofá branco de couro sintético, sob a meia-luz de um abajur, embalado por Natalie Cole ou Etta James. Sozinho, obviamente. Muito melancólico pelo cansaço da semana que acabara de acabar, ele olha as luzes da capital sob a sacada do seu apartamento no oitavo andar de um prédio na Vergueiro.
Alexandre se formou há dois anos em História da Arte pela Unifesp; ele é de Poá. Atualmente, trabalha na produção de exposições no Memorial da América Latina (e, erroneamente, escolheu ir pela Linha Azul e descer na Sé para fugir do trem pela manhã para a Barra Funda; tolo). Nessa segunda-feira, onde o tempo esfriou um pouco, ele escolheu a roupa de acordo com seu humor: marrom. Mocassins bem lustrosos, calça skinny, casaco de veludo com linhas verticais que aumentavam ainda mais sua silhueta e por baixo, uma camiseta preta de gola mini-rolê - se é que isso existe. Ombreiras, cachecol de uma linha que eu não sei o que é e cabelo castanho claro, liso, com leves luzes de um loiro quase de sua cor natural. Nos fones (inconfundíveis) do iPod, The Vaccines. Na bolsa carteiro (marrom), um bloco de notas em papel reciclável, uma caneta preta infincada na encadernação, diversos folders de exposições da cidade, carteira, chaves, um caderno (também em papel reciclável) e o iPad. Ah, sim, como esquecer? Ostenta um gigantesco relógio de pulso em ouro e ali enxergo 7h55. Ele está inquieto e, provavelmente, atrasado, como eu, que deduzi tudo isso nos próximos dois minutos que separam seu ponto final do meu.

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Hoje encontrei a Anne na estação e isso me tirou a concentração de toda a manhã (talvez, pra não dormir) e me impediu de achar uma paixão. Espero voltar aqui amanhã; esse negócio de olhar com(o) olheira é bacana. Como já diria Edward Norton em Clube da Luta - obviamente, não com, exatamente, essas palavras -, a falta de sono faz com que você não saiba mais se está dentro de um sonho ou acordado. Acho que vou usar isso a meu favor (ou da minha criatividade).

6 comentários:

  1. Laís dos hipsters e oprimidos.

    Essas descrições tão detalhadas e baseadas na realidade de muitos por aí me fazem retomar o pensamento de como as pessoas aderem a um 'pacote personalidade'. Quase que obrigatoriamente, todo jovem que está iniciando uma carreira no ramo das artes ou comunicação é exatamente assim como você descreveu. Roupas, acessórios, gostos, hobbies, corte de cabelo...as variações são minímas e obviamente existe a versão feminina desse perfil (se um dia se atrair por uma menina de metrô das 4h, descreva também). Partindo daí, repenso também que o meu look não permite que meus possíveis olheiros de metrô saibam que eu trabalho nesse mesmo ramo artes/comunicação.

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  2. Fantástica a ideia.
    E você sabe como ninguém dar vazão a tudo isso.
    Parabéns

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  3. sempre imagino a vida das pessoas que por mim passam na estação também. Adorei o texto, Laisinha. Parabéns!

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  4. Adorei, Lalá! Parabéns ((:

    beijos!

    p.s agora estou em dúvida entre Jornalismo e Editoração.. SOS! rsrs

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  5. Moça de Jundiaí,que faz jornalismo e vem pra São paulo todos os dias,bonita a riqueza de detalhes no texto. Bjo

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